Personagens Realistas: O Segredo de Uma Boa Ficção

Qual é o segredo de uma boa ficção? Todos temos um universo ficcional que nos chama a atenção. Mergulhar na profundidade de um cenário e viajar por suas localidades, conhecer culturas, línguas e paisagens empolgantes e desconhecidas é incrível, mas esse não é o segredo do sucesso de uma boa saga.

A essência de um universo fictício reside nas pessoas que o habitam. Somos cativados pelos personagens, um fator determinante para o sucesso de uma obra. Criar personagens autênticos é uma arte que exige mais do que uma fórmula matemática, pois um personagem não pode ser estático ou genérico. Você precisa começar a vê-los como pessoas reais. Neste post, darei dicas sobre como criar personagens cativantes e realistas para sua ficção:

Criando um Background: Contextualize-se na história

Todos nós temos uma história de vida, inclusive seu personagem. Ele não nasceu quando você o inseriu na história, dentro daquele universo fictício, ele já estava lá.
Desvendar eventos significativos que moldaram seus personagens enriquece a compreensão de sua jornada pessoal. Crie uma breve história de origem para cada personagem, mesmo que não a use diretamente na trama. Todos eles precisam ter profundidade suficiente para serem explorados futuramente, se necessário.
O ideal neste caso é manter um banco de dados para facilitar a administração dessas informações, ali você poderá acrescentar novos dados e também consultá-los facilmente enquanto estiver escrevendo.
Use a curiosidade como critério: você deve ser o primeiro a querer saber mais sobre o personagem. Comece a entrevistá-los nos bastidores, perguntando quem são, de onde vêm, quais seus hobbies e o que pensam sobre o futuro, como se estivesse fazendo uma entrevista de emprego com seu personagem (o que de certa forma, não deixa de ser verdade rs).

Ação x Descrição: Personagens Precisam agir!

Nomes intrigantes, diálogos afiados e filosofias profundas são ótimos, mas, no fim das contas, personagens são definidos por suas ações. Em vez de se concentrar em conceitos elaborados, visualize suas figuras em ação. O que fazem? Como reagem sob pressão? Suas ações revelam muito mais sobre eles do que descrições estáticas (e diálogos também podem ser considerados como ações).
A bem da verdade, se quisesse ler um texto meramente descritivo, seu leitor teria comprado um dicionário. Ele quer entretenimento: lágrimas, risadas e explosões. Dê isso à ele. Contudo a história será pobre demais se você a transformar em um destes filmes de ação altamente comerciais, onde um vilão aleatório, sem a mínima introdução, rouba um caminhão de explosivos enquanto o Vin Diesel, que deve possuir algum nome aleatório na trama (o qual você nem se atenta ao longo do filme), tenta impedi-lo de dinamitar uma escola.
Portanto, a complexidade de seu enredo deve ser introduzida enquanto os personagens agem. Isso quebra a monotonia da descrição. Um personagem pode revelar um trauma terrível através de uma conversa ou de uma simples atitude, sem que você precise gastar alguns parágrafos descrevendo isso.

Surpresa e Contradição: Tornand0-os realistas

Assim como na vida real, contradições pessoais adicionam profundidade à caracterização. Em nosso mundo, as pessoas não são perfeitas. Personagens convincentes frequentemente quebram padrões e surpreendem. A curiosidade sempre será o gancho que levará o público a ser cativado pelo personagem (normalmente funciona assim quando conhecemos pessoas em nosso mundo). Ao criar o personagem, você como escritor deve querer saber mais sobre essa pessoa. Se isso funcionar para você, então pode fazer com que seu leitor queira saber mais também. Contradições geram mistérios e questionamentos, tornando seus personagens fascinantes.
A tentação para moldar personagens que se encaixam perfeitamente ao mundo e a história que o envolve é forte, no entanto pessoas mais contraditórias e curiosas muitas vezes se destacam. Conflitos entre a personalidade do personagem e o cenário onde ele vive geram tensão e interesse.
Isso pode até mesmo revigorar personagens secundários. O olhar do público frequentemente se volta para o protagonista, o que leva o autor a investir a maioria dos recursos nele. No entanto, ao fazer isso, pode-se desperdiçar oportunidades de explorar tramas paralelas e enredos secundários.

Detalhes Marcantes: Moldando Identidade

Vai me dizer que a lupa e o cachimbo não te lembram imediatamente Sherlock Holmes?
Ainda mais se ele disser seu famoso jargão: “Elementar, meu caro”. Esses detalhes eternizaram este personagem, de forma que 130 anos mais tarde, nós os reconhecemos imediatamente como marca registrada do detetive.
Detalhes distintos, desde um acessório peculiar até um traço de personalidade marcante, tornam um personagem memorável. Esses elementos únicos enriquecem a identidade dos protagonistas e dos personagens secundários, ajudando os leitores a se conectarem e se lembrarem deles.

Construção Progressiva: Fuja do Óbvio

Um enredo comum em muitos livros segue uma estrutura familiar: um protagonista frágil descobre que um cara mal está planejando destruir o mundo e, então, ele precisa enfrentar todas as inseguranças e seguir uma linha reta em direção à batalha final, onde o vilão o atacará intensamente, mas no último golpe, o protagonista irá derrotá-lo. Troque os nomes e verá que já viu dezenas de histórias assim.
Estamos acostumados com narrativas de três atos: começo, meio e fim (detalharei isso em outro post), onde o início apresenta o problema central que conduz toda a história, o meio é onde o protagonista encontra os meios para resolver o problema e o fim é a resolução. É previsível.
No entanto, frequentemente, o personagem principal é subdesenvolvido. Falta espaço e tempo para sua evolução. Ele é mal introduzido e construído, e no final, o leitor mal sente sua partida.
Essa narrativa linear é previsível, permitindo que o leitor antecipe cada passo do protagonista. Como autor, você deve quebrar esse padrão, desviando o curso da trama e permitindo que seus personagens sigam sua intuição, como pessoas reais. Eles não devem apenas seguir etapas predefinidas, mas agir com motivações genuínas, tal como você faz todos os dias. Permita que eles tomem decisões autênticas, enriquecendo suas personalidades e guiando a história de maneira autentica. Talvez você mesmo se surpreenda com o caminho que seu personagem seguirá “espontaneamente” (e, com certeza, isso será divertido).

Desenvolver personagens em uma obra de ficção é uma imersão profunda na trama por meio das perspectivas individuais de cada personagem, onde cada detalhe constrói uma ponte entre o leitor e o mundo fictício.
Espero que essas orientações possam auxiliá-lo a compreender melhor os personagens que você está criando e permitir que cada um deles desenvolva uma identidade singular. Desejo-lhe uma criação proveitosa e até a próxima!

1 Comment

  • Tay

    Estamos cansaaaaados de obras ( em forma de textos, por exemplo) onde você consegue descobrir/deduzir todo o enredo nos primeiros 5 minutos de leitura.
    Maravilhosa sua contribuição!

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Victor Freitas

Rabiscando papéis desde os nove anos vejo na escrita a forma de conversar comigo mesmo, e através dela convido o mundo para participar desse diálogo. 

Reflexivo e poético, me pego explorando o mundo através de suas metáforas. Romantizando as emoções e os desafios que enfrento todos os dias. Um retrato parecido com os roteiros vividos por cada um de vocês.

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